Rômulo e Remo
Nota: Para o filme com Gordon Scott, veja Romolo e Remo.
Rômulo (português brasileiro) ou Rómulo (português europeu) e Remo são, segundo a mitologia romana, dois irmãos gêmeos, um dos quais, Rômulo, foi o fundador da cidade de Roma e seu primeiro rei. Segundo a lenda, eram filhos de Marte e de Reia Sílvia, descendente de Eneias. A data de fundação de Roma é indicada, por tradição, em 21 de abril de 753 a.C. (também chamado de "Natal de Roma" e dia das festas de Pales).
Índice
1 Tradição
2 Lenda
3 Caverna Lupercal
4 Cronologia
5 Notas
6 Referências
7 Bibliografia
Tradição |
A primeira menção a Remo ocorre em uma das vertentes do mito de Eneias, onde este possui um filho de nome "Rhomylocos", que, por conseguinte, era pai do fundador de Roma, "Rhomus".[1] Os primeiros relatos escritos acerca de Remo provêm de autores gregos, especialmente de Helânico de Mitilene (século V a.C.) e Quinto Fábio Pictor, que inspiraram o relato de autores clássicos como Tito Lívio, Plutarco e Dionísio de Halicarnasso.[2][3] Estes autores forneceram uma ampla base literária para o estudo da mitografia da fundação de Roma. Eles têm muito em comum, mas cada é seletivo para sua finalidade. O relato de Tito Lívio é um digno manual, justificando a finalidade e moralidade das tradições romanas para seus próprios tempos. Ele usa pelos menos uma fonte compartilhada por Dionísio e Plutarco mas os últimos são etnicamente gregos; eles abordam os mesmos assuntos romanos como forasteiros interessados, e incluem tradições de fundadores não rastreáveis a uma fonte comum, e provavelmente específicos para determinadas regiões, classes sociais ou tradições orais.[4][5] Um texto sobrevivente do período imperial tardio, Origo gentis Romanae (A origem do povo romano) é dedicado as variantes, muitas vezes contraditórias, do mito da fundação.[6]
Tanto a loba como o pica-pau, animais sagrados relacionados ao mito dos gêmeos, assim como o estupro sofrido por Reia Sílvia são características de relatos mais antigos como, por exemplo, uma das passagens do Antigo Testamento (Êxodo 2:1-10).[7]
Lenda |
Ver artigos principais: Eneias e Rômulo
Na Eneida de Virgílio e na Ab Urbe condita libri de Tito Lívio, Eneias, filho da deusa Vênus foge de Troia com seu pai Anquises, seu filho Ascânio e os sobreviventes da cidade. Com este realiza diversas peregrinações que o levam, por fim, ao Lácio, na península Itálica. Lá ele é recebido pelo rei local Latino que oferece a mão de sua filha, Lavínia. Isto provoca a fúria do rei dos rútulos, Turno, um poderoso monarca itálico que havia se interessado por ela. Uma terrível guerra entre as populações da península eclode e como resultado, Turno é morto. Eneias, agora casado, funda a cidade de Lavínio em homenagem a sua esposa. Seu filho, Ascânio governa na cidade por trinta anos até que resolve se mudar e fundar sua própria cidade, Alba Longa.[8][9][10][11][12][13][14][15]
Cerca de 400 anos depois, o filho e legítimo herdeiro do décimo-segundo rei de Alba Longa, Numitor, é deposto por um estratagema de seu irmão Amúlio. Para garantir o trono, Amúlio assassina os descendentes varões de Numitor e obriga sua sobrinha Reia Sílvia a tornar-se vestal (sacerdotisa virgem, consagrada a deusa Vesta),[16] no entanto, esta engravida do deus Marte e desta união foram gerados os irmãos Rômulo e Remo.[17][18] Como punição, Amúlio prende Reia em um calabouço e manda jogar seus filhos no rio Tibre.[19] Como um milagre, o cesto onde estavam as crianças acaba atolando em uma das margens do rio no sopé dos montes Palatino e Capitolino, em uma região conhecida como Germalo, onde são encontrados por uma loba que os amamenta;[20] próximo às crianças estava um pica-pau, ave sagrada para os latinos e para o deus Marte, que os protege.[21] Tempos depois, um pastor de ovelhas chamado Fáustulo encontra os meninos próximo ao pé da Figueira Ruminal (Ficus Ruminalis), na entrada de uma caverna chamada Lupercal.[22][23] Ele os recolhe e leva-os para sua casa onde são criados por sua mulher Aca Larência.[24][25][26]
Rômulo e Remo crescem junto dos pastores da região praticando caça, corrida e exercícios físicos; saqueavam as caravanas que passavam pela região à procura de espólio. Em um dos assaltos, Remo é capturado e levado para Alba Longa. Fáustulo, então, revela a Rômulo a história de sua origem. Este parte para a cidade de seus antepassados liberta seu irmão, mata Amúlio, devolve Numitor ao trono e dá a sua mão todas as honrarias que lhe fossem devidas.[27][28][29] Percebendo que não teriam futuro na cidade, os gêmeos decidem partir junto com todos os indesejáveis para então fundarem uma nova cidade no local onde foram abandonados.[28][30] Rômulo queria chamá-la Roma e edificá-la no Palatino, enquanto Remo desejava nomeá-la Remora e fundá-la sobre o Aventino.[31][32] Como forma de decidir foi estabelecido que deveria-se indicar, através dos auspícios, quem seria escolhido para dar o nome à nova cidade e reinar depois da fundação. Tal gerou divergência entre os espectadores o que gerou uma acirrada discussão entre os irmãos que terminou com a morte de Remo.[33] Uma versão alternativa afirma que, para surpreender o irmão, Remo teria escalado o recém-construído pomério quadrangular da cidade e, tomado em fúria, Rômulo teria assassinado-o.[34] Remo foi sepultado em uma região ao sul do Aventino, conhecida como Remoria, sendo também comemorado em 9 de maio a festa chamada Remúria (ou Lemúria) em sua homenagem.[35][36]
Rômulo reinou sob Roma por 38 anos, tendo sido o Rapto das Sabinas um dos fatos mais importantes de seu reinado. Rômulo falece em 11 de julho de 716 a.C. durante uma tempestade provocada pelo deus Marte, na qual é tragado para o firmamento onde é transformado no deus romano Quirino.[37][nt 1] Em outra versão Rômulo é assassinado por ordem do senado romano.[40]
Caverna Lupercal |
Em novembro de 2007, arqueólogos italianos anunciaram que tinham descoberto a caverna em que os romanos celebravam a festa da Lupercália e onde segundo a lenda, Rômulo e Remo supostamente viveram. O especialista Andrea Carandini disse que isto é um dos maiores achados arqueológicos já feitos.[41] A identificação da caverna não foi unânime, no entanto, arqueólogos como Fausto Zevi consideram que é sim uma dependência do palácio imperial.[42]
Cronologia |
Existe muita divergência, tanto entre autores antigos quanto modernos, sobre as datas em que ocorreram os principais eventos na vida de Rômulo e Remo. O quadro abaixo é uma síntese das datas propostas por diferentes autores.
Autor | Concepção | Nascimento | Fundação de Roma | Morte de Rômulo |
---|---|---|---|---|
Cefalão de Gergis | Na segunda geração após a Guerra de Troia, por Romus, filho de Eneias [43] | |||
Timeu da Sicília | 38o ano antes da primeira olimpíada (814 a.C.) [43] | |||
Diodoro Sículo | 751 a.C. [43] | |||
Pórcio Catão | 752 a.C. [43] | |||
Dionísio de Halicarnasso | Durante a sétima olimpíada (752-749 a.C.)[43] | |||
Quinto Fábio Pictor | 748 a.C. [43] | |||
Lúcio Cínto (senador) | 729 a.C. [43] | |||
Eusébio de Cesareia | Durante a segunda olimpíada (772-769 a.C.)[44] | Durante a sétima olimpíada (752-749 a.C.) | ||
Tarúcio, astrólogo a serviço de Varrão | dia 23 do mês Choeac de 772 a.C. (durante um eclipse solar) [45] | dia 21 do mês Thoth de 771 a.C. [45] | dia 9 do mês Farmuti [45] | |
Plutarco | 13 de abril de 754 a.C. (durante um eclipse solar)[45] | 5 de julho, após reinar trinta e sete anos [46] | ||
Jerônimo | 773 a.C. [47] | 21 de abril de 755 a.C. [47] | 716 a.C.[47] |
Notas
↑ Quirino é considerado por muitos como de origem sabina, tendo ele sido relacionado ao deus romano Marte após a incorporação deste povo. Além disso, não há evidências até o século I a.C. do sincretismo entre Rômulo e Quirino.[38][39]
Referências
↑ Bendlin 2001, p. 1130.
↑ Salles 2008, p. 112.
↑ Halicarnasso século I a.C., p. 1, 72-90; 2, 1-76.
↑ Momigliano 1990, p. 101.
↑ Dillery 2009, p. 78-81.
↑ Cornell 1995, p. 57-58.
↑ Beck 2001, p. 89.
↑ Pedro 2005, p. 69.
↑ Plutarco século I, p. 1.2.
↑ Floro século II, p. I, 1.4.
↑ Lívio 27-25 a.C., p. 1,3.
↑ Halicarnasso século I a.C., p. 1.71.
↑ Sículo século I a.C., p. VII, 5.
↑ Virgílio 19 a.C., p. VI, 767.
↑ Ovídio 12, p. IV, 35.
↑ Plutarco século I, p. 3. 2.
↑ Plutarco século I, p. 3. 4.
↑ «The Founding of Rome» (em inglês). Consultado em 17 de abril de 2012
↑ Floro século II, p. I, 1.2.
↑ Lívio 27-25 a.C., p. I, 4.
↑ Plutarco século I, p. 4, 2-3.
↑ Varrão século I a.C., p. V, 54.
↑ Plutarco século I, p. 4. 1.
↑ Plutarco século I, p. 3, 5-6.
↑ Lívio 27-25 a.C., p. I, 5-7.
↑ Floro século II, p. I, 1.3.
↑ Plutarco século I, p. 7-8.
↑ ab Lívio 27-25 a.C., p. 1,6.
↑ Floro século II, p. I, 1.5.
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↑ Halicarnasso século I a.C., p. 1.85.
↑ Plutarco século I, p. 9, 5; 10, 1-3.
↑ Salles 2008, p. 111.
↑ Plutarco século I, p. 9, 4; 11, 1.
↑ Ovídio 12, p. 445-492.
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↑ Evans 1992, p. 103.
↑ Fishwick 1993, p. 53.
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↑ «Romulus and Remus cave may have been found - experts». Consultado em 29 de abril de 2012
↑ «È uno splendido ninfeo, ma il Lupercale non era lì». Consultado em 29 de abril de 2012
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↑ Eusébio de Cesareia, Crônica, As Olimpíadas Gregas, Uma lista desde a primeira olimpíada até a 247a quando Antonino, filho de Severo, era imperador dos romanos [em linha]
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Bibliografia |
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